{"id":126,"date":"2023-11-08T07:27:13","date_gmt":"2023-11-08T07:27:13","guid":{"rendered":"https:\/\/www.mozavibe.co.mz\/?p=126"},"modified":"2023-11-14T06:36:42","modified_gmt":"2023-11-14T06:36:42","slug":"mar-morto-mudancas-climaticas-mudam-a-vida-na-ilha-de-mocambique","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/2023\/environment\/mar-morto-mudancas-climaticas-mudam-a-vida-na-ilha-de-mocambique\/","title":{"rendered":"Como a falta de marisco afecta comunidades na Ilha de Mo\u00e7ambique"},"content":{"rendered":"<figure id=\"attachment_186\" aria-describedby=\"caption-attachment-186\" style=\"width: 1280px\" class=\"wp-caption aligncenter\"><img loading=\"lazy\" decoding=\"async\" class=\"wp-image-186 size-full\" src=\"https:\/\/www.mozavibe.co.mz\/wp-content\/uploads\/2023\/10\/Mulheres-Ilha-de-Mocambique.jpg\" alt=\"\" width=\"1280\" height=\"720\" srcset=\"https:\/\/mozavibe.co.mz\/wp-content\/uploads\/2023\/10\/Mulheres-Ilha-de-Mocambique.jpg 1280w, https:\/\/mozavibe.co.mz\/wp-content\/uploads\/2023\/10\/Mulheres-Ilha-de-Mocambique-700x394.jpg 700w, https:\/\/mozavibe.co.mz\/wp-content\/uploads\/2023\/10\/Mulheres-Ilha-de-Mocambique-768x432.jpg 768w, https:\/\/mozavibe.co.mz\/wp-content\/uploads\/2023\/10\/Mulheres-Ilha-de-Mocambique-449x253.jpg 449w, https:\/\/mozavibe.co.mz\/wp-content\/uploads\/2023\/10\/Mulheres-Ilha-de-Mocambique-533x300.jpg 533w, https:\/\/mozavibe.co.mz\/wp-content\/uploads\/2023\/10\/Mulheres-Ilha-de-Mocambique-300x169.jpg 300w\" sizes=\"(max-width: 1280px) 100vw, 1280px\" \/><figcaption id=\"caption-attachment-186\" class=\"wp-caption-text\"><em>Popula\u00e7\u00e3o da Cabeceira Pequena vive da apanha de mariscos e se ressentem da sua falta | Foto: DR<\/em><\/figcaption><\/figure>\r\n\r\n<p>\u00a0<\/p>\r\n<p>Aprenderam a conviver com o mar como extens\u00e3o delas pr\u00f3prias. Mas a pesca desregrada animada pela ind\u00fastria mostra-lhes uma faceta do mar que ainda n\u00e3o se habituaram a lidar. Falta peixe e falta marisco, como se o mar, que sobe por conta das mudan\u00e7as clim\u00e1ticas, estivesse morto. Esta \u00e9 a hist\u00f3ria de mulheres e homens que veem a vida mudar e de uma instala\u00e7\u00e3o que lhes quer dar rosto e resgatar a mem\u00f3ria. \u00a0<\/p>\r\n<p>Aos 15 anos, j\u00e1 o n\u00edvel do mar definia os caminhos de vida de Rosa Napaua. A mar\u00e9 baixa marcava sempre a hora da apanha do xocolo, um molusco protegido por uma concha que j\u00e1 foi mais abundante na regi\u00e3o da Ilha de Mo\u00e7ambique. O nome deu nome ao verbo \u201cxocolar\u201d, que significa o exerc\u00edcio da actividade.<\/p>\r\n<p>Sem grandes margens de futuro, xocolar mostrou-se a actividade para que Rosa (agora com 35 anos) e a fam\u00edlia n\u00e3o morressem \u00e0 fome. A apanha agora \u00e9 para a subsist\u00eancia. Mas em tempos que a mar\u00e9 baixa era generosa servia tamb\u00e9m para montar um pequeno neg\u00f3cio e ajudar a comprar mais mantimentos para casa.<\/p>\r\n<p>Como ela, quase todos os cerca de 5\u00a0000 habitantes que perfazem a popula\u00e7\u00e3o da Cabeceira Pequena vivem da apanha de xocolo e se ressentem da sua falta. \u201cEm todas as casas aqui, tem algu\u00e9m que trabalha com xocolo\u201d, disse. \u00c9 como uma profiss\u00e3o passada de gera\u00e7\u00e3o em gera\u00e7\u00e3o. Maiumuna Asmin - 28 anos \u2013 \u00e9, pelo menos, a terceira gera\u00e7\u00e3o da sua fam\u00edlia que se dedica a esta actividade. \u201cMinha m\u00e3e faz, minha av\u00f3 faz e ela tamb\u00e9m diz que aprendeu com a m\u00e3e dela\u201d, explica Maimuna.<\/p>\r\n<p>\u00c0 Cabaceira Pequena, este peda\u00e7o de terra atirado ao mar \u00cdndico chega-se por uma viagem de barco a partir da Ilha de Mo\u00e7ambique. O mar marca o horizonte de toda a popula\u00e7\u00e3o nascida aqui.<\/p>\r\n<p>Mulheres como Rosa e Maimuna tiveram de aprender desde cedo a linguagem das mar\u00e9s. Uma actividade a exigir a paci\u00eancia que talvez apenas as mulheres tenham. \u201cOs homens v\u00e3o mais para pesca\u201d, revela Rosa.<\/p>\r\n<p>A fila indiana que fazem em direc\u00e7\u00e3o \u00e0 faina como que convoca a mem\u00f3ria b\u00edblica da prociss\u00e3o em meio ao mar aberto para a fuga de um passado de dor. Os baldes que levam \u00e0 cabe\u00e7a s\u00e3o preenchidos por um Xocolo de cada vez, depois da m\u00e3o esventrar a terra enlameada. \u00a0\u201cDemora a encher\u201d diz Maimuna e depois confirma que, muitas vezes, nem enche.<\/p>\r\n<p>E nestes momentos em que t\u00eam o mar aos p\u00e9s e apenas o c\u00e9u por cima delas s\u00e3o as can\u00e7\u00f5es entoadas em emakhuwa que v\u00e3o animando \u00e0 apanha. S\u00e3o m\u00fasicas de alegria, quando a faina \u00e9 proveitosa e de tristeza quando n\u00e3o conseguem apanhar xocolos que, pelo menos, lhes saciem \u00e0 fome.<\/p>\r\n<p>E, de um tempo a esta parte, confessam Rosa e Maimuna, tem se repetido muitas vezes cen\u00e1rios de escassez. \u201cAntes, apanh\u00e1vamos muito xocolo. Agora, \u00e9 sempre um pouco de cada vez. \u00c9 mesmo s\u00f3 para comer\u201d, revela, com uma voz embargada que n\u00e3o consegue disfar\u00e7ar a incerteza do futuro. Tamb\u00e9m por isso, como uma esp\u00e9cie de pacto que aprenderam a fazer com o mar, j\u00e1 n\u00e3o se fazem ao mar sempre que a mar\u00e9 baixa. \u201c\u00c9 preciso dar tempo para que a \u201cpopula\u00e7\u00e3o\u201d de xocolos continue a crescer. N\u00e3o sabemos por mais quanto tempo teremos xocolo\u201d, diz Rosa.<\/p>\r\n<p>O que se pode dever a uma apanha desenfreada. Mas tamb\u00e9m a subida do n\u00edvel do mar ocasionada pelas mudan\u00e7as clim\u00e1ticas. N\u00e3o \u00e9 para menos. Mo\u00e7ambique, com mais de 3.000 km de costa, foi considerado, nos \u00faltimos anos, um dos cinco pa\u00edses do mundo e o n\u00famero 1 no continente mais afectado pelos efeitos das mudan\u00e7as clim\u00e1ticas.<\/p>\r\n<p>S\u00f3 em 2022, foram 4 ciclones tropicais e nos pr\u00f3ximos anos podem ser esperados ainda mais. O que costumava ser um evento a cada 20 ou 50 anos, agora \u00e9 uma amea\u00e7a permanente para as comunidades pesqueiras em condi\u00e7\u00f5es muito vulner\u00e1veis.<\/p>\r\n<p>Este impacto \u00e9 ainda agravado pelo facto de o n\u00edvel do mar ao redor da Ilha ter subido rapidamente e deve chegar a 20 cent\u00edmetros nos pr\u00f3ximos 7 anos, o que pode significar a elimina\u00e7\u00e3o desses comunidades e seu patrim\u00f3nio.<\/p>\r\n<h3><strong>Uma instala\u00e7\u00e3o para repensar a vida com o mar<\/strong><\/h3>\r\n<p>\u00a0<\/p>\r\n<p><strong><img decoding=\"async\" class=\"alignnone size-medium wp-image-129\" src=\"https:\/\/www.mozavibe.co.mz\/wp-content\/uploads\/2023\/10\/Exposicao-ilha-de-mocambique.jpg\" alt=\"\" \/>\u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0 \u00a0<\/strong><em>Exposi\u00e7\u00e3o imersiva, cria\u00e7\u00e3o e curadoria de Yara Costa, na Ilha de Mo\u00e7ambique<\/em><\/p>\r\n<p>\u00c9 para salvar a terra e com ela homens e mulheres e resgatar a sua mem\u00f3ria a que veio a instala\u00e7\u00e3o imersiva \u201cNakhodha (Nahota) e a Sereia\u201d, que nos coloca a bordo de um <em>dhow<\/em> para uma viagem em torno das muitas vidas do mar e com elas propor caminhos de regresso a um passado que era j\u00e1 futuro. \u00c9 a arte interventiva, a tentar fechar a \u00faltima comporta antes do mundo se esvair.<\/p>\r\n<p>No edif\u00edcio de uma antiga alf\u00e2ndega, no cora\u00e7\u00e3o da Ilha de Mo\u00e7ambique, Yara Costa, que \u00e9 a cineasta que assina a cria\u00e7\u00e3o e curadoria da instala\u00e7\u00e3o, devolve a Ilha este lugar de centro do mundo e faz-nos repensar como, enquanto humanidade, ainda podemos salvar o planeta. \u201cH\u00e1 uma pesca industrial que est\u00e1 acontecer que faz com que n\u00e3o haja peixe e mariscos e quem sofre depois \u00e9 o pescador artesanal, as mulheres de xokolo, as comunidades\u201d, diz Yara.<\/p>\r\n<p>E a nossa participa\u00e7\u00e3o na instala\u00e7\u00e3o como que a nos confrontar com esta realidade. E tamb\u00e9m por isso \u00e9 um lugar de crescimento de quem participa. Come\u00e7amos talvez num lugar de meros espectadores da experi\u00eancia do mar. Mas vamos aprendendo, a partir da realidade virtual, as suas vidas e as formas de vida que o mar invoca at\u00e9 chegarmos a posi\u00e7\u00e3o de senhores do mar. \u00c9 caminho que se faz em alguns minutos, mas que leva toda uma vida para ser feito na realidade \u201creal\u201d.<\/p>\r\n<p>E por tr\u00e1s dessa odisseia, na perspectiva de regresso ao lugar de partida, de um passado em que a rela\u00e7\u00e3o homem e natureza era de complementaridade, esta uma pessoa real, Jorge Jamal Sadique cuja vida de mar lhe valeu o lugar de Nahota, uma categoria a que apenas o andaime da experi\u00eancia \u00e9 capaz de nos colocar.<\/p>\r\n<p>\u201cPara se ser Nahota \u00e9 preciso aprender a interpretar os fen\u00f3menos meteorol\u00f3gicos, como a temperatura, a velocidade e a direc\u00e7\u00e3o do vento, condi\u00e7\u00f5es de navega\u00e7\u00e3o, estado do mar, entre outras. Ele tem que aprender isto tudo que mencionei, s\u00f3 assim pode ser considerado Nahota e n\u00e3o pode dirigir a embarca\u00e7\u00e3o de qualquer maneira, tem que obedecer regras\u201d, avisa Jorge que tamb\u00e9m \u00e9 conhecido como Thorodji.<\/p>\r\n<p>Hoje trabalha como seguran\u00e7a j\u00e1 reformado da vida do mar, uma reforma compulsiva a que chega pela morte lenta do mar. Iniciado na pesca em linha, conta que hoje a pesca tornou-se desregrada e talvez isto explique muito da escassez do peixe hoje. \u201cIsto obriga os pescadores que tinham o mar da Ilha de Mo\u00e7ambique como os postos de trabalho acabem por pescar em mares como o de Moc\u00edmboa da Praia\u201d, disse.<\/p>\r\n<p>Uma viagem que, com o vento a favor, pode durar cerca de 5 dias, com o vento contra pode levar at\u00e9 20 dias.<\/p>\r\n<p>Com o olhar distante, do tempo em que regressava \u00e0 margem com o barco pesado com mais 40 kg de peixe. Nos seus \u00faltimos dias de pesca \u2013 corria o ano de 2019 \u2013 havia dias que conseguia apenas 5 kg. \u201cNoutros, podia at\u00e9 voltar sem nada\u201d, conta.<\/p>\r\n<p>N\u00e3o viu outra alternativa, se n\u00e3o procurar uma nova fonte de renda. Mas pescador uma vez, pescador sempre. E ainda coloca algumas gaiolas \u201cmalemas\u201d na esperan\u00e7a de que consiga apanhar algum peixe, pelo menos, para lhe saciar a fome e matar a saudade dos velhos tempos. \u201cNoutro dia, lancei 7 gaiolas para dentro e quando fui tirar todas nem um peixe consegui tinha\u201d, disse com o tom de quem procura gra\u00e7a para n\u00e3o viver lavado em l\u00e1grimas.<\/p>\r\n<p>\u00a0<\/p>\r\n<p><strong>Por Elton Pila<\/strong><\/p>","protected":false},"excerpt":{"rendered":"<p>Aprenderam a conviver com o mar como extens\u00e3o delas pr\u00f3prias. Mas a pesca desregrada animada pela ind\u00fastria mostra-lhes uma faceta do mar que ainda n\u00e3o se habituaram a lidar. Falta peixe e falta marisco, como se o mar, que sobe por conta das mudan&#8230;<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":127,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"wds_primary_category":5,"footnotes":""},"categories":[16,5],"tags":[25,26,24,23,46],"_links":{"self":[{"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/126"}],"collection":[{"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/users\/2"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=126"}],"version-history":[{"count":23,"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/126\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":718,"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/126\/revisions\/718"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/media\/127"}],"wp:attachment":[{"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=126"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=126"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"https:\/\/mozavibe.co.mz\/pt_PT\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=126"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}