João Faustino da Costa destaca-se em várias frentes que impulsionam o desenvolvimento em diferentes vertentes, desde a mais essencial, que é a paz e o bem-estar social que tanto precisam os moçambicanos e no ramo de negócios e desenvolvimento de competências. Baseado na cidade da Beira, deu importante contributo, enquanto Facilitador Provincial de Reintegração, do Escritório das Nações Unidas de Serviços para Projectos (UNOPS), no processo de pacificação do país que culminou no Acordo de Cessação Definitiva de Hostilidades Militares em 2019. A UNOPS tem como objectivo ajudar diferentes parceiros a implementar projectos de ajuda humanitária, desenvolvimento e construção da paz, nos contextos mais complexos do mundo, mediante práticas sustentáveis. Enquanto isso, a sua luta está na mobilização e promoção de oportunidades de negócios. O seu faro para os negócios levou-o a uma iniciativa inovadora de criação e estabelecimento de marca de perfume Samora Freedom Fighter, inspirado no primeiro presidente de Moçambique.
Esta entrevista é para conhecer o seu perfil, o percurso e as ideias que podem transformar e inspirar Moçambique.
Podemos começar pelo seu trabalho como voluntário na ONU e num processo importante como a paz em Moçambique. Enquanto moçambicano, como encara esse trabalho e fazer parte de uma instituição global, mas procurando solução para Moçambique?
É um privilégio poder fazer parte de uma organização global que dentre várias doutrinas as mais importantes são o desenvolvimento e o progresso das comunidades num ambiente de paz. Como moçambicano a responsabilidade, a importância e o cometimento é maior ainda porque acredito que as barreiras culturais são mínimas para que haja uma melhor comunicação e empenho para implementação da própria paz no país.
Que responsabilidades tem na sua missão e como funciona?
Na verdade, é todo um trabalho em equipa em que as responsabilidades no fundo eram transversais, no meu caso era o de reunir-me com parceiros do sector privado e ou a nível governamental com a finalidade de arranjar oportunidades comunitárias (projectos agrícolas, distribuição de insumos, etc), familiares e ou pessoais (capacitação de jovens e oportunidades de emprego) para os beneficiários neste caso, desmobilizados e seus parentes.
O que é ser voluntário da ONU e que trabalho tem de fazer?
É entrega, é estar pronto e ter em si o dever de servir, apoiar, ajudar independentemente da ocasião, situação e local. É ser mais humano neste mundo adverso. Os projectos variam de acordo com as várias situações no mundo, por exemplo em Moçambique era a situação da guerra, em outras partes do mundo são desastres naturais, o voluntário deve estar preparado para assumir a missão e ajudar. No dia-a-dia é ser paciente e transmitir sempre uma mensagem de paz, compreensão e entendimento a todos em seu redor.
Como chegou às Nações Unidas e aspira para outras missões na organização?
Tive a oportunidade de poder acompanhar o início das negociações do processo de paz como tradutor e daí com o chamamento mais formal para dar continuidade com outras tarefas e responsabilidades (por já conhecer o processo e sua sensibilidade). Estou sempre pronto para novas missões, é o meu dever.
Tendo em conta o seu trabalho com o voluntariado internacional, mas com o empreendedorismo no geral, como olha para Moçambique num cenário mundial?
Não só temos muito a aprender, como também temos que ter vontade de nos abrir para o aprendizado, mas, isto não vai acontecer tão já enquanto houver uma gestão danosa, nenhum perpetuador de maldade quer ser apanhado, enquanto tiver meios irá inviabilizar de forma implacável a todo um corpo de paz, progresso e prosperidade, mas a água e o vento são os elementos de maior abundância e mais fortes no mundo e os mais usados para apagar o fogo.
Como consultor e desenvolvedor de negócios, que áreas identifica como fortes para uma aposta por parte de empreendedores?
São enumeras. Mas permita-me focar no agro-negócio que Moçambique infelizmente ainda não vê o verdadeiro potencial deste sector. Um país com fome, nunca terá a sua saúde estável, e isso, consequentemente, resulta em pouca produtividade e desenvolvimento. Temos alguns jovens, no anonimato em actividade neste momento, mas 95% dos jovens só querem estar na metrópole. Nada contra, mas é notável o congestionamento, as várias frustrações a que estão sujeitos. É preciso reinventarmo-nos, e o jovem moçambicano é forte e lutador, tem muitas ideias, mas há falta de canalização de apoio. Neste momento acho que encontrei uma pequena solução para o empreendedorismo moçambicano, a ver vamos ser realmente os gestores de grandes empresas apoiam a iniciativa ou não. Há que capacitar os miúdos que saem do ensino secundário.
Desenvolveu uma linha de perfumes inspirado em Samora Machel. Como surge essa ideia e como foi a sua materialização?
Esta é uma história interessante! Diz-se que nada acontece por acaso e a humildade, a moderação, a paciência e o respeito, abrem-te portas e deixam boas impressões. Recebi uma proposta de trabalho para Beira e, como sempre, estou pronto para novos desafios, mesmo não havendo capital, arrisco-me; lá conheci o meu parceiro, perfumista brasileiro de renome, bem mais velho que eu, depois de ficarmos amigos decidi lançar-lhe a proposta de homenagear Samora de uma maneira totalmente diferente, pois já existem estátuas, livros, mas perfume? Iniciamos o projecto, distribuímos 500 amostras pelo país para testar a sensibilidade dos moçambicanos sobre o material e foi apresentado no Prémio Cosmetica de Sao Paulo (o maior prémio da América de cosméticos) como inovação do ano 2018.
A marca chama-se é Samora Freedom Fighter. De realçar que 10% do lucro das vendas será canalizado ao Centro de Documentação Samora Machel para causas sociais e o resto para criar capital de giro, como forma de dar continuidade a novos lançamentos. O objectivo é que a ideia não pare por aqui. É importante dizer que não há visão lucros, foram pessoas de vários cantos do mundo, que admiram e amam Samora Machel que se juntaram para que o seu nome continue a ser lembrado no mundo.
Em que estágio está o perfume e como podem os moçambicanos ter acesso?
Neste momento está em reestruturação, pois o pacote vai ficar mais completo, estamos a muito bom passo. Enfrentei muita dificuldade e cepticismo a nível de apoio e patrocínio, mas agora estamos num bom caminho. Tenho a máxima certeza que a temporada 2024/25 será de surpresas boas. É importante realçar que fomos os primeiros a nível mundial a lançar uma essência que homenageia um líder, um presidente.
Já que estamos a falar com um "especialista", como captar as oportunidades e tirar o máximo proveito delas, enquanto jovens a procura de um futuro perseverante?
Com respeito, verticalidade, transparência e humildade, disso dita tudo, mas não é o pacote todo. Não sou especialista, as oportunidades aparecem e eu canalizo-as, procuro encontrar um terceiro parceiro com capital e interessado na diversidade que o pacote apresenta e tanto como eu, motivado a aumentar o rendimento.
Uns dizem que não devemos ter medo, eu digo que o medo é essencial, pois ele leva-nos a boas direcções. Devemos abrir exactamente a porta que por qualquer motivo temos medo de abrir. Temos que arriscar, mas sem trapacear, pisar e ou envergonhar o próximo.